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quinta-feira, 31 de julho de 2014

OLHO

me arrasto lentamente
sem decodificar

é enigma
ainda
construção de silêncio e metais

o apelo
vem das tangentes
ou do círculo
que evolui
sem voz

fica lenta a passagem do tempo
neste dedilhar
que arrebenta as cordas
saturando de música
tudo ao redor

31/07/2014

João Lopes Filho

terça-feira, 29 de julho de 2014

LAMENTO

lamento
que neste julho frio
por estas paragens
o adeus se interpôs
como sílaba
contorno
resto de restos que zombaram
do tempo

lamento
a falta de prumo
a aridez da viagem
o tremor
o sobressalto que nos assombrou

o adeus se fez corpo
eu digo adeus
repito
até crer que há um traço
na estrada
até luzir
até que seja do futuro
a saudade.

29/07/2014

João Lopes Filho

segunda-feira, 28 de julho de 2014

FLAGRA

leio
seu olhar oblíquo
súbito laço

creio
em interrogações
e pontos costurados
com ventania

vou reler
sua face sóbria
e fabricar fantasia.


28/07/2014

João Lopes Filho
ALGO

isto que sinto
é intraduzível
fosco
pedra bruta
corpo

ontem um pequeno rio
pôs-se  em movimento
(sem saber)

desta pedra nenhuma palavra
sinto lapidar a pedra
remar
enquanto a água
não cessa de cair

pedra
isto que sinto
(in)decifrável
intocado
mar imenso.

28/07/2014

João Lopes Filho
GIRO

sendo o que o desejo não sabe
não sei eu
nossos  planetas em tempos opostos
sem  intercessão
nossas galáxias distam anos-luz
 mensagens nunca chegam

anos-luz de desvarios
noite e dia confusos
fuso horário sem tempo

vai virar
poeira

(rimos um do outro)

vai virar
estrela

vai virar poema
girou

28/07/2014

João Lopes Filho

sexta-feira, 18 de julho de 2014

FURO

os discos de Saramago acendem
na sua ordem imutável
moto-contínuo
repetição

o vermelho está confuso
pálido

na marcha em direção a um futuro
sempre futuro
furo

me mesclo à fauna humana volátil
do terminal de coletivos
por uns segundos
sem passagem para nenhum lugar

é  o meio da manhã
é um lugar perdido no mundo
é o mundo

o destino é logo ali
não falta nada
Falta um botão na minha camisa.

João Lopes Filho

21/05/2014

quarta-feira, 16 de julho de 2014

JULHO

o solstício de inverno
nos fez mútua órbita.
os astros, diria,
convergiram tontos
os planos, sem desenho algum,
fluíram...
apenas a palma da mão
mão sobre a outra
mão.

os planos parcos,
os barcos
 luz
os barcos deslizam dançantes
onda... onda...
atravessemos em nuvens.
assim, sem o que excede,
me dê sua mão outra vez.

João Lopes Filho

10/07/2014
CAFÉ

Eu te convido para um café
para deixar o tempo transitar lento
através música que nos embala,
no violão que capta o sonho.

Sua voz nos consola
dos dias fatigantes,
das horas modorrentas,
da repetição.

O sino toca
marcando o tempo que se vai.
Sem lamentar.
O som do sino também marca o devir,
os diversos possíveis.
(O tempo se interpõe).

O café nos aquece,
nos une cúmplices,
desata a alegria.
É festa quando a colher tilinta na xícara.

Eu imagino você cantando.

João Lopes Filho

10/07/2014
ENCONTRO

no (en)tanto
eis-me aqui
diante do indizível
do que causa deslumbramento
 na rota da impossibilidade que se declara
se desnuda
porque estava aí

intraduzível
efeito: um esforço de palavras
um jorro
por um tênue fio de uns instantes

olhos, sorrisos, toques
pele
e o cheiro (im)possível

“quase nada”
quase tudo
espanto
rima
encanto.

Era (im)possível.

João Lopes Filho

09/07/2014
HERMETISMOS
            (Para Lalá Laudares)

Lalá me confessa
o que os astros carimbam como destino,
desata os nós.
os astros escondem o que não vejo no espelho

antes de mim, um mundo
nasci
e um mundo se construiu

estou aqui diante do inexorável
Futuro? Inventar...
ir
retrovisores, faróis, signos...
ir
Lalá, contudo, não me fornece garantia.

João Lopes Filho

09/07/2014
PERFUME

o seu perfume resta tatuado em mim

antes que o sol nascesse
estampou-se sua imagem aqui:
suas gaiatices se insinuam suavemente na memória.

uns instantes que se prolongam por anos
na cronologia que se perde
presença que dá efeito de poesia
se prolonga,
se ergue,
alucina
e segue seu rumo volátil

o seu perfume resta tatuado aqui.

João Lopes Filho

08/07/2014
ENSAIO

ensaio versos neste  precipício
sombras
vozes tantas
 gargalhadas

um vento invernal se lança
(julho não é fácil)

o acaso me trouxe aqui
neste canto almodovariano
onde olhos me encontram: seus

neste precipício avanço
acaso
deixe o acaso
amanhã haverá um novo sol.

João Lopes Filho

06/07/2014
ACONTECIMENTO

deixo que você leve
um pouco de Leminski
as dúvidas intermináveis
algo de Vinícius
alguma dor andante

de Chico, as rimas
(afinal, o Neruda do meu pai perdeu-se...)

carregue consigo um tanto dos meus pensares
Camus em doses pequenas

deixo contigo alguns planos:
um insistente futuro
dramas
alegrias

leve contigo meu amor
em doses homeopáticas
(não esqueça Freud por aí)

deixo contigo um sol novo que nasceu agora
algumas pitadas de Marx
a casa querendo festa
alegria de acordar
e tristezas da casa só

leve com você meus pronomes
meu pai
e a poesia de Castro Alves
minha mãe
e Cecília Meireles
meus irmãos, meus amigos
meus vivos, meus mortos

Leve o que puder
fragmentos de frases
palavras incompletas
o meu cheiro que você gostou

Leve os segundos, os minutos
leve a minha poesia

deixe esta inspiração
o sol novo que contigo nasceu
respiração
a alegria que me trouxe
Fico com os sorrisos, a fricção, a sua alegria
Fico com mais além

Leve contigo o que não sabe ainda.

João Lopes Filho

07/07/2014
QUASE

beira
os ventos não escrevem histórias
(precipício)
nem as águas entoam canções

aqui é quase
vácuo
nítidos olhos
ocaso
(precipício)
acaso

futuro apenas
tudo
aqui o coração quase vai.

João Lopes Filho

07/07/2014
TRIZ

na sua vinda breve
tanta poesia se fez.
vida breve:
luz em algum lugar.

por acaso mudo o rumo
sem bússola
as perguntas fazem coreografias no ar
“o pulso ainda pulsa”.

João Lopes Filho

07/07/2014
DESENCONTRO

dois
para um
promessa

dois
paralelos e antônimos
desassossego

dois
sutis movimentos
relógios que ignoram o tempo

dois
corpos inflamados
sentimentos líquidos

dois
estradas  bifurcadas
e bifurcadas outra vez

dois
um e um sem soma
nenhum lugar.

João Lopes Filho


06/07/2014
AGORA

queria ter mãos aladas
flanar
ir além do pensamento
tatuar meu silêncio em seu corpo
não esquecer seu nome
guardar o cheiro que ainda sinto
seguir no ritmo das batidas do seu coração

queria ter asas
cessar seu movimento pendular
queria um ponto neste círculo
meus olhos sobre seu corpo
as mãos sobre as mãos

e no final, aquela alegria
que inicia e finda
gargalhadas
pulsação acelerada
e o esquecimento do futuro.

João Lopes Filho

06/07/2014